Imagine uma garota pequena, de 1.50m, andando pelas ruas da cidade vestida de preto,com piercings adornando o rosto, maquiagem pesada e olhar embrutecido. Ela caminha pelas ruas como se ao redor dela nada existisse, e se existe, ela tem uma atitude “Tô pouco me lixando” para o que quer que seja. Não, você não esta em Londres no ano de 1977. Também não esta na Finlândia em 1982 em um show do KAAOS. Tampouco está em São Paulo nos anos 80. você provalvelmente esta e casa lendo estas palavras e a garota em questão esta dentro de um livro. Se você não sabe, o nome dela é Lisbeth Salander. Ela é fruto da imaginação de Steg larson, criador da série Millenium, que além de livro também virou filme. Mas não quero me ater à crítica literária, pois eu mesmo não li o livro. Mas vi o filme. Também não quero me ater à crítica cinematográfica. Na verdade, estou intrigado com o impacto de Lisbeth em minha percepção cultural desde que vi o segundo filme da série, “A Menina que Brincava com Fogo”.
De repente, a figura pequena e frágil de Lisbeth me retoma aos anos clássicos que vivi na União Libertária de Minas Gerais, uma seccional do movimento anarquista mineiro que participei nos anos de 1992. De repente, vi que naquela figura puramente estética e singular, havia o germe daquilo que naqueles anos eu conheceria como Movimento Punk. Ou melhor, Anarco-Punk. Roupa preta, Correntes, cara de poucos amigos, música barulhenta e rápida, braceletes e por aí vai. Estética. Coisa que na época eu não admitira nunca. Era um protesto visual. Um protesto contra o sistema estabelecido. Eu e muitos amigos, alguns de longa data, outros nem tanto, éramos adeptos deste ideal. De certa forma, ainda sou. Mas mudou algo crucial. A estética. Mas isso não vem ao caso.
A questão é que Lisbeth Salander também odeia o sistema. E além de odiá-lo, luta contra ele. Em 1994 haviam fanzines e panfletos xerocados e distribuídos nas ruas de qualquer cidade ou show de punk rock. Hoje, a internet se faz muito mais presente. Lisbeth é uma hacker, faz seu “modo protestandi” pelas teclas. Ela não parece mais acreditar nas instituições de nosso malfadado sistema capitalista. Mas talvez ela não tenha utopias. Seu movimento me parece mais pessoal, individual, assertivo. Que se encontra com outras pessoas, pois todos somos coletivizados, embora nem sempre o coletivo funcione.
Lisbeth é uma punk rocker do século XXI. Creio que em seu ipod ela deva ouvir Atari Teenage Riot e Ministry. Também escuta The Eploited, pois não deixei de perceber uma cena em que ela esta com a camiseta de “beat the bastards” dos escoceses. Beat the Bastards. Arrebente os bastardos. Nada mais punk que isso, não ? Mas retornando à Lisbeth, há algo a mais em sua atitude. Ela não pensa em mudar o mundo. Os punks de antigamente e de hoje querem mudar o mundo. Lisbeth quer viver sua vida. Quer justiça pelas atrocidades que viveu. Quer ser ela mesma. Johnny Rotten dos Sex Pistols já urrava em 1977 na música “I wanna be Me!!”. Eu quero ser eu!! Este é o dilema de Lisbeth. Um dilema shakeaspeareano de ser ou não ser, em um mundo tão globalizado caoticamente que existir em essência hoje é muito difícil. Mas não impossível. E aqui esta Lisbeth. Ela que viver sua vida, onde cada dia mais a vida parece esvair de sentido. Desta forma, creio que Lisbeth resiste. Aqui esta outro dilema, um tanto quanto existencialista. Mas não dá pra escapar da vida , não é mesmo ?
O que me encanta em Lisbeth Salander é sua resistência. Seja na era digital, seja no início do século XXI,na era das máquinas, desta matrix nossa de cada dia,seja lá o que for, Lisbeth resiste. Resiste por ser humana e por ser mulher. Resiste por que resistir já é lutar o bastante, quiçá vencer a batalha. Quanto a guerra... tanto Lisbeth como nós mesmos travamos ela todos os dias, não ?
Penso que quando a vida imita a arte, surgem personagens como Lisbeth Salander. Pode-se compará-la com outras heroínas, mas jamais iguala-lá. Nela vejo um pouco de Emma Goodman e um pouco de Maria Lacerda de Moura. Um pouco de Frida Khalo e um pouco de Evey Hammond. E mesmo sendo uma personagem fictícia, fruto da imaginação de um autor que viveu no outro lado do mundo, parece-me real. Demasiadamente. E ela está dentro de mim de alguma forma. Como também está dentro de você.
quinta-feira, 19 de abril de 2012
domingo, 15 de abril de 2012
True Spirit Records !!
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